
A Biblioteca do Meio Ambiente Milton Santos, no bairro dos Barris, em Salvador, sediou na manhã desta sexta-feira (14) a roda de conversa “Entre o preconceito e a natureza: enfrentando o racismo ambiental”, iniciativa da Secretaria do Meio Ambiente da Bahia (Sema), por meio da Diretoria de Educação Ambiental e Sustentabilidade (DIEAS). A atividade integra a programação do Mês da Consciência Negra da Biblioteca Central da Bahia e teve como objetivo estimular o debate público sobre como desigualdades raciais influenciam o acesso a direitos socioambientais.
O racismo ambiental diz respeito às injustiças sociais e ambientais que recaem de forma desproporcional sobre grupos racialmente vulnerabilizados, como populações negras, indígenas e tradicionais. Ele não se caracteriza apenas por ações com intenção explícita de discriminação, mas também por decisões, políticas e práticas que, mesmo sem essa intenção declarada, produzem impactos que atingem mais duramente esses grupos. Isso ocorre porque os “ônus e bônus” da urbanização — como acesso a saneamento, infraestrutura, mobilidade, áreas verdes e proteção contra enchentes — são distribuídos de maneira desigual. Assim, territórios ocupados majoritariamente por essas populações acumulam riscos ambientais, enquanto outras áreas concentram os benefícios da cidade, perpetuando desigualdades históricas e ampliando a vulnerabilidade social.
A bibliotecária Nádia Cristina Xavier, responsável pela organização do evento, destacou a importância de a Biblioteca do Meio Ambiente ser também um espaço de reflexão e construção coletiva.
“Pensamos essa roda de conversa como uma ação essencial para o Mês da Consciência Negra, porque a biblioteca não é apenas um lugar de livros — é um espaço de diálogo. Nosso objetivo foi aproximar o público das discussões sobre justiça socioambiental e dar visibilidade às desigualdades que ainda marcam o território. Promover esse debate é parte do compromisso da biblioteca com a formação crítica e cidadã”, afirmou.
O evento reuniu estudantes da rede pública, pesquisadores, gestores públicos e representantes de comunidades tradicionais. A discussão ocorreu em um momento em que o Estado vem ampliando ações voltadas à proteção de territórios vulneráveis e intensificando o diálogo com as populações mais atingidas sobre políticas ambientais.
A geógrafa Nívea Santana, da Superintendência de Política e Planejamento Ambiental (SPA) da Sema, compartilhou como sua vivência pessoal ajuda a compreender, de forma concreta, os efeitos do racismo ambiental no território.
“Como mulher preta que vive em um bairro periférico, eu sinto diretamente os impactos de eventos extremos, como as chuvas intensas da última semana, que deixam pessoas ilhadas e revelam desigualdades históricas. O racismo ambiental está nesses detalhes do cotidiano, nos espaços onde moramos e nos riscos que enfrentamos”, afirmou. Segundo ela, reconhecer essas realidades é essencial para fortalecer políticas públicas mais justas.
A roda de conversa contou ainda com o professor João Pena, do Curso de Urbanismo e do Programa de Pós-Graduação em Estudos Territoriais da Universidade do Estado da Bahia (Uneb), que trouxe reflexões sobre como o território expressa desigualdades raciais antigas, apesar de o tema ter ganhado maior visibilidade nos últimos anos.
“As redes sociais podem ter ampliado esse debate, mas o racismo ambiental é vivido há muito tempo. Basta observar onde acontecem os alagamentos ou em quais bairros as sirenes de risco são acionadas. Na última onda de chuvas, por exemplo, 13 sirenes tocaram — todas em áreas periféricas, onde vive majoritariamente a população negra. Não vemos esse tipo de alerta nos bairros que concentram população branca de classe média alta. A chuva não é o problema; o problema é que a cidade não foi planejada para proteger todos da mesma forma”, explicou.
Além do diálogo, o público pôde visitar uma exposição bibliográfica com obras do acervo da Biblioteca do Meio Ambiente Milton Santos sobre racismo ambiental, ecologia política e resistência negra. O espaço também exibiu vídeos com relatos de comunidades negras e tradicionais afetadas por conflitos territoriais e impactos ambientais.
Fonte: Ascom/Sema




















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